Domingo, 18 de outubro de 2015 – (Data da publicação original)
Carta do Philip aos pais
Tradução: Ana Gauz
Esta é uma carta de Philip a pais que o contactaram para falar de medos e preocupações em relação a seus filhos diagnosticados com autismo.
Prezados pais,
Sendo um menino autista, quero que saibam que sou feliz. Minha neurologia autista me faz pensar de forma muito diferente da maioria das pessoas. Consigo perceber o mundo de uma forma aguçada, o que me torna uma pessoa muito observadora. As pessoas fazem suposições erradas sobre quem não age como uma pessoa típica. Fazer suposições sobre algo tão importante quanto seu filho é perigoso se você tirar as conclusões erradas. Eu sofri as consequências das suposições dos meus pais. Ser considerado retardado e carente de educação corretiva me levou a muitos anos de ABA e terapias inúteis baseadas nas suposições neurotípicas do autismo. O homem presume muitas coisas sobre as quais não sabe. A melhor forma de se conhecer alguém é ouvi-los pessoalmente. A única forma para me ouvir tem sido por meio do RPM* (Rapid Prompting Method, na sigla em inglês). Acredito que a maioria das pessoas autistas pode fazer uso de meios auxiliares de comunicação. Os pais devem buscar aprender sobre mais métodos de comunicação. Programas de consciência corporal também ajudariam bastante. Meus pais fizeram um monte de terapias. Tornar a vida o mais normal possível e nos ajudar a nos comunicar é o que faz a maior diferença nas nossas vidas. Por favor, nos ensinem coisas interessantes. Não abordem apenas as coisas que vocês querem consertar. Aceite-nos da mesma forma que vocês querem ser aceitos. Principalmente, mantenham uma postura de amor e paciência conosco. Fazer com que nos sintamos amados é essencial para que consigamos vencer os desafios de viver neste mundo.
Com amor,
Philip
* RPM e um método de aprendizado que facilita a comunicação verbal. O aluno pode expressar o que aprende escolhendo uma resposta entre algumas opções ou, à medida em que suas habilidades motoras aumentam, escrevendo suas próprias respostas e textos, seja apontando para cada letra em uma prancha de letras ou digitando em um teclado ou tablet.
Quinta-feira, 28 de abril de 2016 (Data da publicação original)
Progredindo rumo à independência
Tradução: Ana Gauz
Venho progredindo rumo à independência. Aprender RPM mudou minha vida. Nunca voltarei à minha vida de antes. Não estava progredindo com a ABA. Fui parar em um lugar onde ninguém percebia meu potencial. Havia sempre alguém cuidando de mim, o dia inteiro. Saí de lá para ir para uma escola comum onde me tratam como o menino inteligente que sou. Pessoas agradáveis e aulas interessantes dão sentido aos meus dias. Agora minha vida tem progressos duradouros, mas ainda é difícil. Ainda não consigo me comunicar de forma rápida ou independente. Meu progresso é lento, porém real. Trabalho rumo à independência pacientemente. Agora pretendo escrever sem que alguém segure o teclado para mim. Toda noite eu pratico e percebo que estou melhor em alcançar as letras. Adoro perceber que estou me tornando mais independente. Estou também me tornando independente para me arrumar de manhã. A prática diária me ajuda a progredir.
Observação da Lisa*: Agora que Philip está com treze anos, estamos muito empenhados de ajudá-lo a ser mais independente. É um grande desafio porque ele tem pouco controle sobre seu corpo. Em termos técnicos, Philip demonstra elementos de dispraxia, uma dificuldade em executar planos motores porque a comunicação neural entre o cérebro e os músculos está comprometida. Para ser bem clara, o cérebro do Philip funciona muito bem. Ele sabe o que deve fazer. Mas, como ele explicou diversas vezes, seu corpo tem dificuldades em obedecer ao seu cérebro. Há uma espécie de desconexão. Mas isso não significa que não há esperança. Assisti maravilhada ao Philip aprendendo novas habilidades nestes últimos anos. Sei que sua comunicação tem sido parte integrante do sucesso dele. Deu a ele autoconfiança, conexão com outras pessoas e uma forma de processar seus pensamentos e sentimentos. No passado, a superação da ansiedade era uma grande barreira para que ele tentasse coisas novas, como andar de bicicleta e patinar no gelo. Desde que conseguiu se comunicar, ele tem encontrado coragem para não apenas tentar, mas também conseguir. Matriculá-lo em programas elaborados especificamente para o ensino de crianças com necessidades especiais foi muito benéfico. Acredito que treinar a memória muscular foi fundamental para ele aprender a andar de bicicleta e patinar, e sei que esse tipo de prática irá ajudá-lo em casa também. Nós estruturamos os dias do Philip em torno de rotinas que o ajudem a aprender habilidades repetitivas da vida cotidiana, ao mesmo tempo em que mantemos o ar de novidade no aprendizado e na resolução de novos problemas. Demos um tempo extra para ele se arrumar de manhã com menos ajuda minha, embora eu ainda supervisione e oriente verbalmente. Agora, ele faz uma parte do seu dever de casa usando o teclado na mesa, digitando independentemente. Ele e seus irmãos fazem tarefas domésticas à noite. Geralmente, as tarefas do Philip, feitas em sistema de rodízio, consistem em arrumar a sala, colocar suas roupas sujas no cesto, levar o lixo para fora, tirar a louça lavada da lava-louça, e separar os talheres, os pratos e as tigelas. Tudo é feito devagar, mas vale a pena porque há progresso. Isso me faz pensar no meu personagem favorito das fábulas de Esopo: a Tartaruga, da “A Tartaruga e a Lebre”. Como diz a moral da história, “Devagar se vai ao longe”.
* Lisa Reyes é a mãe de Philip.
Philip Reyes tem 13 anos e estuda em uma escola pública em Williamsville, NY. Ele é o autor do blog Faith, Hope and Love with Autism. Seus textos já apareceram em jornais locais e em uma antologia de textos escritos por autistas não falantes. Ele também já escreveu para várias revistas on-line, como Parents, The Mighty e Disability Kidlit.
Ele gosta de andar de bicicleta e de aceitar desafios que o levem a novas experiências. O último deles foi aprender a patinar no gelo.
Ana Gauz nasceu no Rio de Janeiro e mudou-se para Nova Jersey, Estados Unidos em 2009. É formada em Direito pela UFRJ e hoje é tradutora Inglês-Português, tendo se especializado em tradução jurídica.
Ana conheceu Alexia por intermédio de amigas tradutoras e, ao tomar conhecimento do website Autismo em Tradução, encantou-se pela iniciativa.
This was a lovely blog poost
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